SOU UM
HEREGE: acredito mais em horóscopo do que nessa “ciência da
sustentabilidade“.
Duvido
desse personagem, “o ativista”, que mais parece uma mosca que voa sobre o
desespero alheio. Confio na Cruz Vermelha, nos Médicos sem Fronteira, mas
desconfio desse personagem. Pergunto
de onde vem essa grana toda. Hoje em dia ser ativista pode ser uma boa
pedida para quem gosta de conhecer o mundo e aparecer na mídia como
bonzinho.
Afinal,
quem pagou a conta daquela “flotilha da liberdade” (que brincou com o
estado de guerra continuo que o Oriente Médio vive há uns três mil anos)?
Santa Klaus?
Imagina
só que legal para o book de um ativista poder dizer“I was there”… Tem
ativista que vai viver uns vinte anos por conta daquela viagem “humanitária”.
Vai acabar pousando em campanha publicitária por aí. Voltando a sustentabilidade. Claro que devemos cuidar da natureza.
Uma coisa é impedir que uma fábrica jogue lixo no mar, outra coisa é
calcular quanto uma pessoa polui o mundo em seu cotidiano e gerar
impostos, leis, moral e espiritualidade em cima disso. Quando se
delira com demônios, o ridículo é visível. Mas quando o delírio vem
regado a cálculos “científicos”, se torna invisível. A modernidade tem
um fetiche pelo controle cientifico da vida, não resiste ao gozo da
opressão em nome da ciência.
Como
alguém pode conceber uma “ciência da sustentabilidade” sem a paranoia de uma gigantesca burocracia de controle dos detalhes da
vida? Controlar
desmatamento é uma coisa, mas calcular gases emitidos por vacas ou número
de voos individuais ou sapatos “não sustentáveis” é loucura. O
ordenamento sustentável da vida se tornará um tipo de totalitarismo sem
precedentes.
E aí
chegamos à assustadora alma fascista da cultura verde. Cuidado com o que come, onde anda, como vai ao trabalho, como faz sexo.
Não viaje de avião, não coma picanha, não enterre ou queime cadáveres.
Não use sapatos, não use casacos (vistam-se com folhas de parreira,
talvez?).
Como toda forma de fascismo, sempre se trata, ao final, de uma forma de
ódio aos humanos reais, no caso, em nome do amor às lesmas. Ninguém
percebe a marca fascista da “ciência da sustentabilidade”? Sistemas
totalitários não precisam ser sistemas centralizados, como no modelo do
fascismo histórico. Nem tampouco o que importa é o “conteúdo ideológico”,
mas sim a forma de controle cotidiano de hábitos considerados “poluidores
da pureza” desejada.
Basta
somar “dados científicos” à máquina gestora do estado e do mercado
constrangendo o comportamento com leis, impostos e produtos. E,
finalmente, somemos os “Kommandos” (os ativistas) que denunciarão os
“poluidores” à gestão da pureza.
Aliás, um
parêntesis: os nazistas devem estar festejando a proposta de alguns
ativistas antissemitas (sim, eu disse “antissemita”, só tolinhos creem na
diferença entre antissemita e antissionista) de boicotar a “cultura
israelense“. Sei que vão dizer que “cultura israelense” não é a mesma
coisa que “cultura judaica“, mas só os mesmos tolinhos creem nesta
diferença.
Os “não sustentáveis” serão a bola da vez. Temo que um dia esses
fascistas verdes chegarão a conclusão que (como diz um amigo meu bem
esquisito) o canibalismo é a forma mais sustentável de viver.
Afinal de
contas, qualquer coisa que comamos, estaremos ferindo criaturas com
“direitos“. Provavelmente advogados verdes defenderão as vacas contra a
opressão que sofrem dos carnívoros. Em seguida, será a vez das alfaces
terem direitos. O
canibalismo verde pode ser a solução: a pior espécie (os humanos) que já pisou
no planeta comerá a si mesma, num ritual macabro de autopurificação em
nome da sustentabilidade total.
Por
último, tenho uma confissão a fazer. No último final de semana cometi um
ato desesperado contra o fascismo verde. Foi apenas um pequeno ato
singelo que desaparecerá no oceano dos dias por vir.
Queimei
com meu charuto uma maldita mosca que voava sobre mim. Minha culpa, minha
máxima culpa… Será que já existe alguma ONG denominada “Free Flies” (Moscas
Livres)?
Fonte:
Luis Felipe Pondé, pernambucano, filósofo, escritor e ensaísta,
doutor pela USP, pós-doutorado em epistemologia pela Universidade de Tel Aviv,
professor da PUC-SP e de Faap, discute temas como comportamento contemporâneo,
religião, niilismo, ciência. Autor de vários títulos, entre eles, “Contra um
mundo melhor” e “Guia politicamente incorreto da filosofia”. Escreve na versão
impressa da Folha.