terça-feira, 26 de abril de 2011

Sobre Filosofia e Santo Agostinho

#Teólogo, filósofo, escritor e mitógrafo, nascido em Tagaste, próximo de Hipona, na então província romana de Numídia, na África romana, hoje Suk Ahras, na Argélia, conhecido como o último dos antigos e o primeiro dos modernos filósofos a refletir sobre o sentido da história e o arquiteto do projeto intelectual da Igreja Católica, o primeiro grande patrístico do período nissênico, com pensamento próprio, e um dos fundadores da Teologia. Filho de pais ricos, o pagão e depois convertido Patrício e da cristã Mônica, mais tarde canonizada, levou na mocidade uma vida circense e em atividades teatrais. Estudou retórica em Cartago (371-374), onde aos 17 anos passou a viver com uma concubina, da qual teve um filho, Adeodato. Interessou-se por filosofia após ler Hortensius, de Cícero e quando também aderiu ao maniqueísmo, caracterizadamente rigorista e proselitista. Retornando a Tagaste, lecionou retórica por um ano. Mais uma vez em Cartago, continuou no mesmo magistério, por 8 anos.

Passou um ano em Roma e três em Milão, onde começou a ensinar retórica em Milão (384), e conheceu Santo Ambrósio, bispo da cidade. Interessou-se pelo cristianismo, voltou-se para o estudo dos filósofos neoplatônicos, renunciou aos prazeres físicos e converteu-se ao cristianismo (387), quando foi batizado por santo Ambrósio, junto com o filho Adeodato. Retirou-se do magistério, dedicando-se mais intensamente à filosofia neoplatônica. Retornou finalmente à África, e decidiu fundar um mosteiro com os bens que então herdara, em Tagasta (387), a origem da ordem agostiniana. Nessa época perdeu a mãe e, pouco depois, o filho.

Estudou, ensinou e escreveu suas obras. No final de sua vida suas preocupações se concentraram na teologia, buscando aprimorar os conceitos neoplatônicos, os quais aliás deram sustentação teológica à polêmica doutrina sobre a atribuição da divindade às três pessoas: um Pai, um Filho e um Espírito Santo. Morreu durante o cerco de Hipona pelo rei dos vândalos, Genserico, e é festejado como doutor da igreja, venerado no dia 28 de agosto, tido como data de sua morte. Ainda que atingisse a posição de o mais expressivo teólogo e filósofo cristão do primeiro milênio, o seu pensamento não chegou a explicitar um sistema filosófico perfeitamente acabado.

O Tempo

Para Agostinho, o tempo não tem realidade em si, é uma invenção do homem, constituído por três nadas: o passado, que não existe mais; o futuro, que ainda não existe; e o presente, tão fugaz que é uma mistura de passado e futuro. É a partir daí que se compreende com certa facilidade a concepção agostiniana de Deus.

Assim como Platão (427-347 a.C.), Agostinho concebe Deus como uma entidade que pertence a um reino de verdades atemporais, perfeitas e imateriais, com o qual só temos contato de maneira não-sensorial: tendo sido feitos à imagem e semelhança de Deus, uma parte desse reino existe dentro de nós (e pode ser identificado com a alma).

Interioridade

Dentro é outra palavra chave para conhecer o pensamento de Agostinho: em sua busca filosófica, ele deixou de lado a reflexão sobre o mundo exterior, e fez uma profunda introspecção para descobrir a sua interioridade, a essência do ser humano. Por isso, Agostinho é considerado também um pioneiro da psicologia.

Para encerrar, convém lembrar que o cristianismo - antes de Agostinho - pouco tinha de filosófico: consistia da crença num Deus criador que se fez homem e num conjunto de instruções morais. Por isso, o filósofo pôde conciliá-lo sem contradições ao platonismo.

A busca da verdade

A filosofia agostiniana é uma constante busca da verdade, que culmina na Verdade, em Cristo. É um movimento incessante, uma paixão, e, precisamente, a paixão principal: o amor. “Amor meus, pondus meum”, o amor é o peso que dá sentido à minha vida. Verdade e Amor.“Fizeste-nos, Senhor, para Ti e o nosso coração estará inquieto enquanto não descansar em Ti”, diz nas Confissões.

Essa “passionalidade” da filosofia agostiniana não é em nenhum momento irracionalismo ou voluntarismo. Se incita a ter fé para entender, também anima a entender para crer melhor. Nada nos pode fazer duvidar da possibilidade de chegar à verdade. Nada valem os argumentos céticos. Si fallor, sum: se me engano, é uma prova de que sou, diz, antecipando-se, num contexto muito diferente, a Descartes. E com mais clareza: “Sabes que pensas? Sei. Ergo verum est cogitare te, logo é verdade que pensas”.

A verdade está no interior do homem. “Não queiras sair para fora; é no interior do homem que habita a verdade”. E há verdades constantes, inalteráveis, para sempre. Dois mais dois serão sempre quatro. Santo Agostinho tenta esclarecer de onde pode vir essa verdade. Não das sensações, diz, porque essas são e não são, são mutáveis, efêmeras. Tampouco do espírito humano, que, por profundo que seja, é limitado. Essas verdades eternas só podem ter por autor Aquele que é eterno: Deus. São reflexos da verdade eterna, que nos ilumina e nos permite ver. Nisso consiste o que depois ficou conhecido como “doutrina da iluminação”; porém, desde já é preciso dizer que Santo Agostinho não a apresenta nunca como uma “teoria”, mas como uma comprovação. Já no final da sua vida, diz nas Retractationes que o homem tem em si, enquanto é capaz, “a luz da razão eterna, na qual vê as verdades imutáveis”.

Como em Platão, conhecer verdadeiramente é estar em contato com o mundo inteligível. Porém, Santo Agostinho nunca dirá que vemos as verdades em Deus, mas que participamos da luz da razão eterna. Não se deve ignorar, por outro lado, que essa solução para o tema do conhecimento corre o risco de não distinguir de forma adequada o conhecimento natural do conhecimento sobrenatural. Mas essa é uma questão que só será levantada mais tarde, na Idade Média.

A busca de Deus

Em Santo Agostinho, não existem provas formais para demonstrar a existência de Deus. Ainda que toda a sua obra seja uma espécie de itinerário em direção a Deus. Tudo fala de Deus; basta abrir os olhos. Ele é intimior intimo meo, mais íntimo ao homem que a própria intimidade humana. As coisas falam-nos todo o tempo de Deus. Perguntamos-lhes: “Sois Deus?” E respondem: “Não, fomos feitas. Continua a buscar”. De forma retórica – retórica de grande qualidade –, encontramos aí a prova da existência de Deus pela contingência das realidades humanas. A mutabilidáde exige o imutável; os graus de perfeição exigem o Ser perfeito. Em Santo Agostinho, como em outros filósofos de inspiração platônica, está claramente formulado o que será a quarta via de São Tomás de Aquino.

Qual é o melhor nome para Deus? O que se lê no Êxodo: “Aquele que é”. “Non aliquo modo est, sed est est” (Confissões). Santo Agostinho dará com freqüência a Deus o nome de Bem, de Amor, porém não desconhece que antes de tudo Ele é; e porque é o que é, é Amor, Bem, Infinito. São Tomás de Aquino não precisará modificar nada de substancial nesta metafísica agostiniana. Como exemplo das dezenas de textos agostinianos, temos este, das Confissões: “Eis que o céu e a terra são; e dizem-nos em altos brados que foram feitos, pois modificam-se e variam. Porque, naquilo que é sem ter sido feito, não há coisa alguma agora que antes não houvesse: que isso é modificar-se e variar. O céu e a terra clamam também que não se fizeram a si mesmos: somos porque fomos feitos; não éramos antes que fôssemos, de modo a termos podido ser por nós mesmos. Basta olhar para as coisas para ouvi-las dizer isso. Tu, Senhor, fizeste essas coisas. Porque és belo, elas são belas; porque és bom, são boas; porque tu és, elas são.”

Esta última afirmação (quia est: sunt enim) significava a definitiva superação por parte de Santo Agostinho do essencialismo platônico. Deus é causa do ser das coisas, porque é o Ser por essência. Se a fórmula de Santo Agostinho não é essa, a idéia é.


Fontes:

sociedadecatolica.com.br

uol.com.br

brasilescola.com

2 comentários:

  1. Codorna,isso de "pagão" significa exatamente o que? E "canonizado" (ta ai uma palavra que eu nunca achei o significado,eu ja vi assim: " ...Cenarios canonicos..." Mas não sei o que que é O.o

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  2. Pagão é um vocábulo proveniente do latim paganus, que significa "habitante do campo", "rústico" é um termo geral, normalmente usado para se referir a tradições religiosas politeístas. Já o termo "canonizado" é utilizado pela Igreja Católica e diz respeito ao ato de atribuir o estatuto de Santo a alguém que já era Beato.

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